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A narrativa Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, acumula, de acordo com os ângulos por que pode ser encarada, uma metáfora e uma metonímia. Embora o narrador-personagem afirme não ser “um autor defunto, mas um defunto autor”, com isso apenas enfatiza a sua morte espiritual, porque Brás Cubas é em verdade um vivo morto, contando sua história de morte simbólica. As ocorrências do livro são metaforicamente póstumas, porque se prendem a essa morte simbólica de Brás Cubas, à sua morte moral. Quanto à metonímia, a análise do que chamamos latência sensual consciente do autor revela que a Dor humana, motivo da temática do romance, é, por contiguidade ou por força do detalhe artístico, representada por uma dor específica, a do conflito sexual. Sob as aparências de restringir o universo da obra -, que deve ser vista em sua globalidade de potencial estético, a descoberta de tal subjacência, que se encontra num enredo contíguo ao patente ou em elementos paralelos a este enredo, estabelecendo-se com este, que tem vigor simbólico, uma interação -, antes amplia pela ambiguidade o valor estético dessa obra. (Do item Aspectos de latência sensual consciente).
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Em Machado de Assis: latência sensual consciente – concebe-se um escritor não só realista, mas também neonaturalista e neossimbolista, de um peculiar neossimbolismo, criando uma simbólica ligada a antropônimos e topônimos, a nomes como o nariz, o chapéu, o mar, o dinheiro, o emplasto, os calçados e a política, tudo se inserindo no sentido do contexto. Por ser consciente, tal latência não se conecta à biografia do escritor e não se vale de parâmetros psicanalistas, mas baseia-se em recursos retóricos, estilísticos, semânticos, etimológicos, isto é, em todos os níveis da linguagem e na autotextualidade.
Nomes como Bento, Capitolina, Glória e Escobar ver-se-ão presos a uma simbólica marítima em Dom Casmurro, e os nomes Virgília, Eugênia, Marcela, Brás Cubas e Lobo Neves têm significado de influência decisiva na problemática semântica do enredo das Memórias Póstumas. A visão do ciumento Bentinho é sublinhada, e o motivo da doença de Brás Cubas surge numa leitura colhida da ambiguidade e das entrelinhas. Aliás, a leitura destas é o que se mira constantemente na análise empreendida do contexto dos livros machadianos e de certas narrativas curtas de Eça de Queirós, de cantigas de Pero Meogo e de determinados textos de alguns autores brasileiros.
O leitor verificará que o fantástico das Memórias será eliminado pelo alegórico, do que resultará um Brás Cubas vivo morto, a escrevê-las não no outro mundo, porém ante as inquietudes de um realismo psicológico e pessimista desta vida.
Sem se eliminarem interpretações e análises anteriores ao presente estudo, e atentando-se para sugestões e desafios do ficcionista ao crítico e ao leitor, propõe-se uma leitura crítica em que o latente sensual se reflete no patente.
O livro destina-se especificamente a interessados na obra machadiana, a professores e alunos de Literatura e Psicologia como a críticos literários.
Linhares Filho
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Formato 16X23cm
ISBN: 978-65-5361-077-4
250 páginas.
R$ 84,70 R$ 59,29
Linhares Filho (José) é cearense de Lavras da Mangabeira, nascido em 1939. Poeta e ensaísta crítico. Chegou a Professor Titular de Literatura Portuguesa na Universidade Federal do Ceará, em cujo Mestrado, de que foi Coordenador, lecionou também Literatura Brasileira. Mestre em Literatura Portuguesa pela UFRJ e Doutor em Letras Vernáculas pela mesma Universidade. Membro Efetivo da Academia Cearense de Letras desde 1980 e da Academia de Letras e Artes do Nordeste. Prêmio Estado do Ceará de Ensaio (1986) e de Poesia (1987). Pesquisador na Universidade Clássica de Lisboa (1987). Professor Visitante na Universidade de Colônia (Alemanha,1985) e na Universidade Técnica de Aachen (Alemanha, 1995 e 2000). Colaborador, entre outras revistas, da Colóquio/Letras, de Lisboa; Revista Brasileira, da Academia Brasileira de Letras; Literatura, de Brasília; e O Escritor, da União Brasileira de Escritores. Detentor do Diploma do Mérito Cultural, concedido pela Academia Brasileira de Filologia (Rio de Janeiro); Presidente de Honra da Academia Lavrense de Letras; Professor Emérito da UFC (2015); escolhido Príncipe dos Poetas Cearenses pela ACL (2016); Comendador da Ordem do Mérito Cultural Ideal Clube (2021). Publicou, entre outros, os livros A Metáfora do Mar no Dom Casmurro (1978); A Outra Coisa na Poesia de Fernando Pessoa (1982); Ironia, Humor e Latência nas Memórias Póstumas (1992); O Poético como Humanização em Miguel Torga (1997); A Modernidade da Poesia de Fernando Pessoa (1998); O Amor e Outros Aspectos em Drummond (2002); Itinerário: quarenta e cinco anos de poesia (2014), englobando nove livros publicados separadamente; Consagração à Poesia (2017).