Doidos, drogados, tarados, fetichistas, assassinato, Curitiba. Poderia ser um resumo, ou imitação de Dalton Trevisan, vampirismo literário, quem sabe? Acho que Lucas Haas Cordeiro matizou, neste seu pavão, uma trama furta-cor, atravessada por diversas personagens alucinadas (de luz e de loucura), numa linguagem também furta-cor, uma espécie de cromatismo psicodélico do frio, uma arquitetura em que o nosso horror de cada dia nos dá bom dia e boa tarde e boa noite, revela-se-nos humano, e pra isso ele partiu de uma tradição nossa que passa por Dalton Trevisan, Rubem Fonseca, mas também por romancistas como Thomas Pynchon e David Foster Wallace, para travar um diálogo sério. Não se trata do simples gozo com a perversão alheia, embora a todo instante ela nos remexa, nem de virtuosismo da linguagem exuberante dessa cauda, mas de uma experiência complexa de códigos e vivências, poética da prosa no seu chão mais duro. Lucas topa correr o seu quinhão de risco — risco não era poesia? — para escrever nesse limite difícil em que as dicotomias se borram (prosa X poesia, sanidade X loucura). O que aqui brota demanda muito, por vezes hesitamos no que estamos lendo, no que pode estar acontecendo ao redor. Não é fácil escrever assim. Alguém, na pressa, poderia até pensar “tudo o que fica é repetição. Nada enquanto narrativa, realmente.” não será fácil pro leitor desavisado. Atente. Uma pena pode estar na tua mão.