Search

Sonhava que andarilho, no calçadão petit pavé da Rua XV, no pedacinho da Rua das Flores, andava com a cabeça em petúnias, amores-perfeitos e bocas-de-leão.

Encostei no bondinho vermelho.

Se vou reto, chego na Boca Maldita. Se subo a Ébano Pereira, encontrarei a Biblioteca Pública do Paraná.

Andarilho das brumas, quero antes de tudo os canteiros do Jardim Botânico e do Bosque do Alemão, como já disse, estou com a cabeça em flores, no travesseiro florido, por isso pensava eu – permaneça na rua das flores.

Há flores em tudo o que eu vejo”, “Que vejo Flores em você”, “Flores em minha camisa numa tarde do bairro”, pareço passar por canções do: Titãs, Ira, Chico Science e Nação Zumbi.

Repare, não estou para brincadeira: neste sonho, percebo as “flores do mal” de Baudelaire, elas estampam a vitrine em que me acho agora.

Falo baixinho o verso que leio “A imagem de um balé de flores/ Tais vestes loucas são o emblema/ De teu espírito travesso;/ Ó louca por quem enlouqueço…”.

Andava agora com a pressa que um dia eu não tive. Quando caminhei no centro da cidade, com minha mãe, outras vezes com meu pai, era um tempo lento para amá-los intensamente.

Neste sonho, avistei o escritor Valêncio Xavier saindo da Livraria Ghignone, ela ficava na rua XV, parecem ter voltado a viver neste sonho.

O carnaval passou, as flores não. Encontro sempre os escritores que gosto nos meus sonhos, já estive em grandes conversas com vários. Alguns avisei, outros avistei, outros vieram sem avisar.

Sei que contei para todos com que sonhei, o que sonhei, os vivos, é claro!

Andarilho, enquanto moças em botões e flores caminham umbigando seus caules por entre as calçadas em que me escondo.

Sou presa fácil, quero polinizar em versos a prosa que diante de mim escapa.

Jardins bailam ventanias enquanto andarilho, andava no sonho em canteiros.

A capivara me olhou, atravessou as nuvens com seus filhotes, quis tocá-las, não pude.

Na Rua das Flores há um bonde vermelho, sobrevoei a cidade dentro dele, eram folhas verdes as que abaixo estavam com suas copas a veranear.

Andarilho, na rua XV, no pedacinho da Rua das Flores, o tempo escorre em espirais ofegantes, nos ronronares.

No silêncio do travesseiro, encontro Baudelaire, “Para não serem os escravos martirizados do Tempo/embriaguem-se; embriaguem-se sem descanso/ Com vinho, poesia ou virtude, a escolher.”

Poderia beber com ele, o sonho me levava, andarilhava, engolia nuvens, sabia que logo tudo chegaria ao fim.

Adiante, avistei em flores um casal, não sei quem eram estes, flores nos cabelos, camisetas floridas, sorriram para mim e atravessavam o poente.

Não eram daqui, desta crônica.

Acordei cuspido de lá, ao lado da escrivaninha uma flor solitária, ao meu lado a doce companheira dorme lindamente, penso em voltar a dormir, quem sabe estar lá de novo, caminhar com meus pais como na infância e na juventude no calçadão da Rua XV,

Sinto o perfume das flores nesta crônica para morder às margens selvagens transcendentais de um sonho florido

Na réstia de luz que abraçava a escuridão, vidrei os olhos no grilo verde que dormia na parede, ouvi “Bird” Charlie Parker, tocando “Don’t Blame Me”, abracei minha garota florida, na Rua XV, no pedacinho que dá na Rua das Flores, encostei no bodinho vermelho e adormeci.

Fabio Santiago é poeta e prosador. Publicou os livros Intramurus, Versos magros (compre aqui), Mar de sombras e Cantos temporais. Instagram: @fsantiago006

2 respostas

  1. Caro escritor e poeta, tua crônica iluminou e inspirou meu café da manhã, que se alongou por mais tempo que de costume, Vi-me passeando por uma Curitiba encantadora, com o cotidiano sob luzes e perfumes das fores. Sua crônica é um buquê de memórias , as citações de versos, poetas e artistas, como são gratas e bem vindouras. O texto é um primor, todo ele. Permita-me aqui transcrever um trechos que muito me tocaram (entre outros):
    ” Acordei cuspido de lá, ao lado da escrivaninha uma flor solitária, ao meu lado a doce companheira dorme lindamente, penso em voltar a dormir, quem sabe estar lá de novo, caminhar com meus pais como na infância e na juventude no calçadão da Rua XV, Sinto o perfume das flores nesta crônica para morder às margens selvagens transcendentais de um sonho florido”
    Muito obrigada pela partilha, @fabiosantiago006

    1. Fabio, tenho me encantado com suas crônicas! Está, especialmente, levando-me junto em seus sonhos, na poesia que cavalga em.asas de brisa, perfumes de flores.
      Uma lindeza, menino.
      Você tem trilhado um lindo caminho também na prosa (poética prosa)!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *