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Querida palavra “querida”, por muitos anos sofreste, injustamente, a insinuação deste cronista de que foste utilizada, pelo interlocutor (a), de maneira a expressar um fingimento, insinceridade, falsidade…

Venho lhe pedir desculpas públicas, minha querida “querida”, e lhe dizer que utilizo-a da maneira sincera e carinhosa com todos, todas e todes, por que não?

Deixando o “todes” para uma outra ocasião, retorno a você, “querida”, para lhe pedir que não guarde sentimentos pesados sobre um sujeito como eu. Sempre andei tonto e desconfiado, sabe, quem muito se lasca tem receio de tudo.

Hoje, respondi em minhas redes sociais todas as mensagens agradecendo aos queridos, queridas e, por que não, querides?

Recordo a intransigência dos 30 anos, quando você parecia tão distante de mim.

Se alguém pronunciasse que-ri-do, parecia surgir uma certa ânsia injustificável e que, hoje, envergonhadamente, me arrependo.

Querida palavra “querida”, de uns anos para cá, consegui enxergar o quão afetuosa, carinhosa, tu és!

Palavra amiga, onde expresso o querer bem as pessoas, quando saem dos meus lábios ou do teclado.

Estimada, apreciada, prezada, benquista… Palavra querida, cá estou, listando alguns sinônimos seus. Como pude ser tão insensível? O jovem selvagem e arredio que fui cegou-me e hoje morro de amores por ti, querida palavra “querida”.

Você vive em meu vocabulário e sinto-me bem com isso, querida.

Sabe, não duvido que existam pessoas desqualificadas que lhe usam com ares de falsidade. Isso não está totalmente descartado. Não sejamos ingênuos, querida palavra “querida”. Digo-lhe: acredito serem poucos os que ousam profanar a sua existência em tom maldoso.

Enquanto escrevo para você, bebo uma cerveja forte e ouço o cantor Tom Waits no álbum Small Change (1976), aquele em que ele está no camarim. Na capa, a garota de calcinha e sem blusa, The Piano Has Been Drinking (Not Me), canta o querido, por que não?

As sutilezas de uma palavra, a delicadeza de um sentimento, querida palavra “querida”, eles não sabem o que fazem. Quando lhe colocaram para atingir uma mulher honesta que tanto admiro, numa frase: “Tchau, querida”. Estes canalhas queimaram a língua e hoje quem recebe o troco é aquele verme, com a nossa desforra: “Tchau, querido”. Inelegível.

Retorno a minha ode para você, querida palavra “querida”, agora lhe chamo de minha amiga e por ti arrumo briga, sou inimigo de seus inimigos.

Raul Seixas canta: “Tu és o grande amor da minha vida. Pois você é minha querida/ E por você eu sinto calor”; Chico Buarque canta, em “Querido Diário”, “Hoje topei com alguns conhecidos meus/ Me dão bom-dia, cheios de carinho/ Dizem para eu ter muita luz, ficar com Deus”.

Ponho um pouco de amor em minha cadência quando recordo o poetinha camarada,
Vinicius de Moraes, em seu “Samba da Benção”, composto com Badeco (Baden Powell e Marcelo Peixoto): “A bênção, maestro Antônio Carlos Jobim/ Parceiro e amigo querido, que já viajaste tantas canções comigo/E ainda há tantas por viajar”.

Sua benção, palavra “querida”, parceirinha querida, que fizeste tantos textos comigo e em muitos há de estar.

Fabio Santiago é poeta e prosador. Publicou os livros Intramurus, Versos magros (compre aqui), Mar de sombras e Cantos temporais. Instagram: @fsantiago006

Uma resposta

  1. Querido poeta e prosador, amante das artes e dono de palavras. Elas te querem como o imã atrai o ferro. Parabéns, teu texto está lindo demais. E que boas “cutucadas”, em quem não sabe desse amor. Nem do amor por amor. Um beijo! Cada dia você escreve melhor e mais bonito. Um beijo, poeta

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