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Está em sua mão o capítulo 8 de Finnegans Wake, “Anna Livia Plurabelle”, o mais conhecido do livro. Foi muitas vezes traduzido, e por nomes importantes, como Samuel Beckett. O próprio Joyce acompanhou a tradução de “ALP” para o francês e o italiano.
É deste capítulo a porção do livro que Joyce leu para um gravador em 1929, em Cambridge, quando o título Finnegans Wake, que emergiu em 1939, ainda era um mistério e o livro se chamava “Work in Progress”, uma “Obra em curso”.
Ao escrever esta orelha me pego pensando no quanto a palavra “orelha” é importante em Finnegans Wake, obra-rio em que riocorre Persse O’Reilly (oreille = orelha) ou Earwicker (ear = ouvido / orelha). Em outras línguas, esse flap do livro tem nomes menos sugestivos. Que capricho da língua portuguesa ter orelha e não rabat!
Penso, também, em como o tradutor Vinícius Alves, habitante das águas catarinenses, fez bom uso da memória infantil gravada na concha da sua orelha para usar nesta tradução de “Anna Livia Plurabelle” o falar das lavadeiras da praia de Cacupé.
Nada de “gagagueira dublínica” por aqui. O “somtido” vem de outras praias. Joyce foi cristalino ao dizer que Anna Livia fala a língua de um rio. Por isso, quem mergulha a traduzir essa conversa de lavadeiras à beira do Liffey precisa nadar livremente pelas águas que lhe marulharem. “Agorouva”, diz uma das mulheres. E quem esticar as orelhas e lhe obedecer vai aos poucos sair da deriva “antiabecedariana” e entrar no delta da fruição.
Deixe-se, às vezes, ir à toa. Navegue pelo som desta tradução para sentir o curso do rio e entender que Finnegans Wake, como os melhores trabalhos da literatura, nunca deixou de ser uma obra em curso.
Esta tradução é da pontinha da orelha. Ouça até o final que “vais ti finná dirri”.
Vitor Alevato do Amaral
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Finnegans Wake, “Anna Livia Plurabelle
ISBN: 9786553610491
Total de Páginas: 96
Formato: 15X21 cm
R$ 44,70 R$ 31,29
James Augustina Aloysius Joyce nasceu em Dublin, na Irlanda, no dia 02 de fevereiro de 1882. Filho de família católica, recebeu uma rígida formação com padres jesuítas, contra a qual mais tarde se rebelou.
Com vinte anos exilou-se em Trieste, na Itália, com Nora Barnacle, mais tarde a Sra. Joyce, com quem teve dois filhos, Lucia e Giogio, e um neto, Stephen, filho deste último. Teve vida atribulada e sérios problemas de visão.
Entre seus livros mais famosos constam Ulisses (1922) e Finnegan Wake, (1939), que poderíamos considerar o livro do dia e o livro da noite, respectivamente.
Joyce faleceu em Zurique, na Suíça, no dia 13 de janeiro de 1941.
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TRADUTOR
Vinícius Alves nasceu em Florianópolis em junho de 1961. É editor, escritor e tradutor. Publicou vários livros de poemas e traduções, entre eles, olho & fôlego e isso, poemas, pela Bernúncia Editora, e Pomas Penicada (Pomes Penyeach) de James Joyce, Urutau, SP, 2018 e A Caça ao Cascação (The Hunting of the Snark), de Lewis Carrol, Cultura e Barbárie, Florianópolis, 2019. Trabalha atualmente na versão completa de Finnegans Wake, de Joyce, da qual este livro faz parte.