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Continuando o caminho aberto em seus dois livros anteriores de poesia – Deus está dirigindo bêbado e nós estamos presos no porta-malas (2019) e Poemas para a noite dos mortos-vivos (2020) –, Andityas Soares de Moura Costa Matos aprofunda uma imprevisível e algumas vezes cômica viagem entre os retalhos do que um dia pôde se chamar Brasil, território hoje dominado por um bovinismo boçal, arrogante e suicidário. Nessa perspectiva, o poeta inventaria cuidadosamente os absurdos da condição atual do país, que bem poderiam ilustrar um bestiário medieval se não fossem tão inegavelmente kitsch, bandeira e lema dos canalhas governantes cujas taras e neuroses parecem comprimir o cérebro de todos aqueles ainda capazes de pensamento. Mas não só a exótica e perigosa fauna de Brasília povoa estas páginas ferozes, dado que o poeta, como se estivesse morto e enterrado, dirige suas blasfêmias ao suposto bom mocismo do politicamente correto, aos egoicos discursos identitários, às panelinhas literárias e aos ridículos lugares de fala que mais não fazem do que compactuar secretamente com o fascismo tupiniquim, este que separa a humanidade em grupos autoexcludentes para melhor gerir o gado. As armas que a poesia aqui concentrada sacam contra tudo isso são pobres diante da força real das milícias cariocas (e muitas outras) que sustentam o poder e seus ilegalismos, mas ao menos têm a duvidosa honra de se juntar a uma longa tradição em que o sarcasmo, a ironia e a provocação pura e simples nos lembram que o deboche é libertador. Assim, Andityas se inscreve em uma linhagem que vai do romano Juvenal ao catalão Joan Brossa, das russas Akhmátova e Tzvietáieva aos nossos Gregório, Drummond e Piva, vendo na palavra e em sua incandescente materialidade a força sempre viva do NÃO!
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Trata-se de uma poesia que apenas um adjetivo pode defini-la – diferente – porque é nova a emoção que o leitor sente. Qualquer coisa profundamente real e profundamente surrealista.
Geraldo França de Lima (2001)
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Como dissemos, a passagem pela poesia de Andityas Soares de Moura se destila como uma experiência agônica. Passagem que, longe de nos acenar com o fim do túnel, se estende como o percurso mesmo do ser humano. Entre naufrágios e salvamentos nos fazemos, fazendo o que chamamos de História. O poeta enveredou por essa passagem, confundindo-se às vezes com ela. A linguagem resultante de seu trabalho reflete a complexidade do objeto que admira e por ser emendada pelas tensões pode vir a ser uma máscara de oxigênio ou um quarto sufocante. O risco está à frente e para o poeta que se pretende humano não há como se desviar desse caminho.
Edimilson de Almeida Pereira (2002)
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Lo intuitivo y lo racional se mezclan en Andityas, tocan la revelación y demuestran otra vez que el poeta es el animal más sano. La reflexión vida/poesía es constante en textos poseídos por un hambre fuerte de verdad que construyen una ética resultado de una estética: la verdad de la palabra como pasado que va a ocurrir. Frente al mundo que enfrentamos cada día, no es pequeña la esperanza de esta aventura poética y humana. La poesía de Andityas se instala en la lengua como cuerpo que no la deja dormir.
Juan Gelman (2005)
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Esse traço gnóstico, ou do qual o gnosticismo é metáfora, o inconformismo, é evidente na poesia de Andityas Soares de Moura. Expressa-se como crítico contundente da sociedade em que vivemos, do mundo regido pela lógica da mercadoria. Interessante como os poemas da negação e crítica são extensos; os do êxtase e registro do sublime são concisos, sintéticos, como cabe às iluminações. Em comum a Blake e Andityas Soares de Moura, e a uma estirpe de místicos, a capacidade visionária de enxergar o macrocosmo, o Universo, no microcosmo.
Cláudio Willer (2010)
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Verão de 2022
Poemas Póstumos
Formato: 15X21 cm
Total de páginas: 140
ISBN: 9786553610293
R$ 44,70 R$ 31,29
Andityas Soares de Moura Costa Matos é escritor, tradutor e professor universitário na Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre e Doutor em Filosofia do Direito pela UFMG. Doutor em Filosofia pela Universidade de Coimbra. Pós-Doutor em Filosofia do Direito pela Universitat de Barcelona. Desde 2012 coordena na UFMG o Grupo de Pesquisa O estado de exceção no Brasil contemporâneo. Publicou os livros de poemas Lentus in umbra (edição própria, 2001; edição espanhola com tradução de Francisco Álvarez Velasco, Trea, 2002), OS enCANTOS (in vento, 2003), FOMEFORTE (in vento, 2005), Algo indecifravelmente veloz (antologia poética editada em Portugal, Edium, 2007), Auroras consurgem (7Letras, 2010), Deus está dirigindo bêbado e nós estamos presos no porta-malas (Urutau, 2019) e Poemas para a noite dos mortos-vivos (Urutau, 2020), além do livro de contos Oroboro – lançado em Portugal (Temas Originais, 2010) e no Brasil (7Letras, 2012) – e a prosa autobiográfica A parodia vivente ou a pavorosa sciencia de vêr: memórias de um pé quebrado (Urutau, 2021). O seu ensaio A letra e o ar: palavra-liberdade na poesia de Xosé Lois García foi publicado em Portugal (Universitária, 2004) e na Galiza (Trad. Amelia Piñeiro Santorum, Toxosoutos, 2009). Organizou o volume Lírica de Camões: uma seleção (Crisálida, 2004) e Poesia é flor de alto calibre: antologia poética de Xosé Lois García (2021). Traduziu A rosa dos claustros (Crisálida, 2004) da galega Rosalía de Castro, Isso (em parceria com Leonardo Gonçalves, Universidade de Brasília, 2004), Com/posições (Crisálida, 2007) e dibaxu/debaixo (Edium, 2007; Secretaria de Cultura do Estado do Ceará/Universidade Federal do Ceará, 2009), todos do argentino Juan Gelman, além da plaquete À boa teta e outros quatro licenciosos poemas da França renascentista (Crisálida, 2005). Traduziu e publicou no Suplemento Literário de Minas Gerais poemas do catalão Joan Brossa.
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