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O principal personagem destes dois textos de Felipe Cattapan – a peça de teatro e a novela aqui enfeixadas – é o processo intelectivo desta criatura supostamente onisciente a que chamamos narrador. É ele, o intelecto, com a sua desde sempre limitada articulação em palavras, quem move os personagens de forma a criar uma forte tensão entre os pressupostos arquitetônicos do texto (relacionados ao tempo, no caso da peça; e ao espaço, no caso da novela) e o enigma deste movimento incessante, intangível e absurdo que constitui a nossa existência. Com maestria de quem conhece o poder do não-dito, Felipe escreve sobre escrever, de olho no interstício, no respiro que representa a cumplicidade de outro personagem central deste livro: o leitor ou espectador. Aquele que realiza o movimento poético para fora do palco ou das páginas, fraternalmente dividindo com diretor e narrador a busca por esse possível lugar e tempo absolutos, míticos – libertadores.
Marcos Pamplona
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O novo livro de Felipe Cattapan – UM ESPAÇO ALÉM DO TEMPO, UM TEMPO ALÉM DO ESPAÇO – apresenta ao leitor um autor em plena maturidade. Ele contém uma peça de teatro e uma novela marcadas por um intenso experimentalismo formal. Refletindo a experiência do autor como músico, o diálogo “X Minutos” é estruturado à maneira da “sinfonia do Relógio” de Haydn. Cada ato corresponde a um movimento. Parece música, mas é literatura; parece ópera, mas é peça de teatro; parece poesia, mas é prosa. Já “Emulação”, novela em forma de diário, é marcada por grandes descontinuidades formais à maneira de Machado de Assis. Ambas as obras possuem uma filosofia e uma temática existencialistas, remetendo a autores como Kafka, Pessoa, Sartre, Camus, no plano literário, ou Tarkovsky, no cinematográfico. Cattapan recusa ideologias e estilos de vida pautados em valores não-humanísticos e, portanto, alienantes. A liberdade do espírito adquirida pela tomada de consciência exige, porém, que o indivíduo esteja à altura do trágico da existência. Efêmera e precária, a vida não possui um sentido intrínseco: trata-se apenas de um “tempo” finito a ser preenchido em um “espaço” circunscrito. A existência só pode adquirir significado pelo modo como cada ser vivente os experimenta dignamente. Na qualidade de lente da realidade, a arte se torna para Cattapan o meio privilegiado de substantivamente preencher esse tempo e ocupar esse espaço, considerados como a forma da vida. São seus valores que lhe permitem viver a vida de forma autêntica, conferindo à rotina uma significação espiritual capaz de transcender aquelas limitações e encontrar, quem sabe, a possível redenção. Orientado por um culto íntimo à verdade da vida, o cotidiano se torna uma experiência mágica de liberdade – espécie de religião sem Deus, na qual sacerdote e fiel são uma única e mesma pessoa.
Christian Edward Cyril Lynch
professor do Iesp-Uerj, pesquisador da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB) e sócio titular do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB); colunista do Canal Meio.
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Um espaço além do tempo, um tempo além do espaço
Felipe Cattapan.
1 ed.
Curitiba : Kotter editorial, 2024.
Formato 16X23 cm
160 p.
ISBN 978-65-5361-314-0
R$ 64,70 R$ 45,29
A filosofia existencialista em obras de Felipe Cattapan é profundamente explorada em seu mais recente livro, Um Espaço Além do Tempo, Um Tempo Além do Espaço. Este volume, composto por uma peça de teatro e uma novela, revela um autor em sua plena maturidade criativa e intelectual. Com uma habilidade singular de fundir forma e conteúdo, Cattapan traz ao público uma obra que desafia as convenções narrativas, propondo um diálogo entre diferentes artes e filosofias.
As duas principais obras do livro – a peça “X Minutos” e a novela “Emulação” – demonstram um experimentalismo formal intenso. “X Minutos” se estrutura de forma reminiscente à “Sinfonia do Relógio” de Haydn, onde cada ato da peça corresponde a um movimento musical. Desta maneira, a obra transita entre música e literatura, entre ópera e teatro, entre poesia e prosa, criando uma experiência multidimensional para o leitor e espectador. Por outro lado, “Emulação” apresenta uma forma de diário com descontinuidades que lembram a técnica de Machado de Assis, destacando-se por sua narrativa quebrada e reflexiva.
No centro temático das obras de Cattapan, encontra-se uma forte crítica aos estilos de vida e ideologias alienantes, não baseados em valores humanísticos. Ambas as obras abordam temas existencialistas, evocando figuras literárias e filosóficas como Kafka, Pessoa, Sartre e Camus, além de Tarkovsky no cinema. A narrativa constrói-se sobre a efemeridade da vida, que não possui um sentido intrínseco, mas adquire significado através da forma como é vivenciada.
Felipe Cattapan concebe a arte como uma lente da realidade, uma forma de ocupar o espaço e preencher o tempo que define nossa existência. Assim, a arte não apenas reflete, mas também molda a realidade, proporcionando ao indivíduo uma forma de viver autenticamente. Neste contexto, o cotidiano transforma-se em uma experiência de liberdade mágica, uma “religião sem Deus”, onde o criador e o espectador compartilham do sagrado.
A obra de Felipe Cattapan, por sua riqueza formal e profundidade temática, convida o leitor a uma introspecção sobre a própria existência. As camadas de significado em Um Espaço Além do Tempo, Um Tempo Além do Espaço são um testamento da capacidade do autor de capturar a complexidade da condição humana através da arte.
Felipe Cattapan é escritor, regente e docente universitário brasileiro residente na Suíça (www.cattapan.ch). Como escritor e músico ganhou os prêmios “Excelência e Qualidade Brasil – Melhores do Ano” em 2014 e 2017, categoria “personalidade do ano/destaque cultural” (Braslider Org., São Paulo).
Vencedor de diversos prêmios literários no Brasil e em Portugal, é colaborador de renomadas antologias e revistas, como a Insight Inteligência. Seu livro de estreia Densidades Cíclicas(poemas e contos) foi o mais vendido pela editora em 2017.