O país assiste nos últimos dias a uma verdadeira escalada de violência das Polícias Militares [PMs]. Ações de truculência e abuso de autoridade dominam a cena cotidiana. Trata-se de um comportamento autoritário e abusivo de uma força policial numerosa e presente em todo território nacional, auxiliar das Forças Armadas nacionais, segundo definição institucional.
A chegada do presidente Jair Bolsonaro ao governo fortaleceu o protagonismo das PMs, que atuam sem ordenamento dos governos estaduais e, cada vez mais, adotam uma prática repressiva, com a adesão crescente aos valores e ideias de extrema direita, de tipo fascistizante. Além disso, cresce a percepção em setores da população mais pobre e periférica da existência de uma parceria informal entre alguns policiais militares e os grupos milicianos – muitos integrados por ex-membros das forças de segurança.
Durante a semana assistimos a prisão arbitrária de um dirigente do PT de Goiás, o professor Arquidones Brites [secretário de movimentos populares da legenda], conduzido de forma violenta para uma delegacia por colocar uma faixa escrita com os dizeres “Fora Bolsonaro Genocida” sobre o capô do seu carro. Brites estava presente na manifestação 29M. Um policial furioso brandia artigos em nome da famigerada Lei de Segurança Nacional.
Os policiais militares tentaram enquadrá-lo no artigo 26 da Lei de Segurança Nacional, que prevê pena de um a quatro anos de reclusão pelo crime de calúnia ou difamação dos presidentes da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal (STF). A detenção do militante pela PM foi completamente fora da lei, arbitrária.
No sábado passado (29), em Recife, o show de horrores foi protagonizado pela tropa da PM que reprimiu com muita violência a manifestação pelo “Fora Bolsonaro” no centro da capital pernambucana. A PM disparou balas de borracha que atingiram os olhos de um manifestante e de um morador que passava no local, ambos ficaram cegos de um dos olhos. A vereadora Liana Cirne Lins (PT) também foi atacada covardemente com spray de pimenta nos olhos quando tentou interceder pelo fim da repressão contra os manifestantes.
E na tarde desta sexta-feira (4), o vereador do PT em Curitiba, Renato Freitas, foi vítima de ação truculenta da Polícia Militar enquanto jogava basquete e ouvia música com amigos em uma praça pública na região central da cidade. O parlamentar petista, que é negro, foi detido pela PM e encaminhado ao Batalhão da Polícia Militar. A truculência da PM com o vereador foi filmada e postada nas redes sociais de advogados e ativistas pelos direitos humanos.
Deter a escalada repressiva das PMs
As descontroladas ações repressivas de policiais militares revelam o preocupante avanço do bolsonarismo no interior das PMs, que atuam com uma assombrosa sensação de impunidade. Nos últimos meses, as PMs têm operado com uma maior desenvoltura na repressão contra militantes e ativistas políticos.
Surge das entranhas do governo bolsonarista uma espécie de sistema policial de conjunto mais repressiva, em aliança com a milícia paramilitar, uma modalidade que vem sendo instituída na prática no país – e que opera a sua legitimação institucional via o aparelhamento político das forças de segurança, contempladas também por diversos tipos de estímulos oficiais do presidente Jair Bolsonaro.
Uma ação governamental autoritária e demagógica que fomenta a violência e a criminalização da pobreza para obter o apoio político de setores mais reacionários e conservadores da sociedade.
A questão da segurança pública é complexa, de difícil resolução, e tem uma relação direta com a própria natureza do regime capitalista, gerador de exclusão estrutural e concentração de riqueza -, mas a esquerda precisa enfrentar o tema com coragem, propor medidas e disputar politicamente com a narrativa da extrema direita bolsonarista.
Temas como a defesa intransigente dos direitos humanos, a reforma urgente do sistema penal, a reforma e o desarmamento das PMs, o fim da política de encarceramento em massa, uma ampla descriminalização das drogas, o combate duro aos bandos milicianos, mais investimentos sociais nas comunidades pobres e a reformulação da doutrina das forças de segurança são alguns dos desafios para a construção de uma política de segurança pública nacionalmente estruturada, humanista e integral.
Milton Alves é ativista político e social. Autor dos livros ‘A Política Além da Notícia e a Guerra Declarada Contra Lula e o PT’ (2019), ‘A Saída é pela Esquerda’ (2020) e de ‘Lava Jato, uma conspiração contra o Brasil’ (2021) – todos pela Kotter Editorial. Escreve semanalmente em diversas mídias progressistas e de esquerda.