A retomada das mobilizações populares impulsionada por um frente única prática dos partidos de esquerda e dos movimentos sociais, demanda a construção de uma pauta para além do enfrentamento imediato ao governo bolsonarista – em fase de crescente desgaste popular e paulatina decomposição política.
A tese da convocação de uma nova Assembleia Nacional Constituinte [exclusiva] – no bojo de uma vitória das forças de esquerda e populares – é um debate que precisa ser feito de forma clara e mobilizadora, demarcando com os blocos das direitas – bolsonarista e a velha direita neoliberal – que preferem manter um ectoplasma chamado de Constituição, mutilada por sucessivas medidas desregulamentadoras e antissociais dos governos neoliberais de Temer e Bolsonaro.
O golpe de 2016 contra o mandato da presidenta Dilma Rousseff rasgou os dispositivos elementares do estado de direito liberal consagrados na Carta de 1988. O processo foi aprofundado durante a vigência da operação jurídica-policial da Lava Jato e com a vitória eleitoral da extrema-direita nas eleições de 2018, pleito marcado por ações golpistas e Lula proscrito da disputa eleitoral e aprisionado -, o que facilitou o caminho para a vitória de Jair Bolsonaro.
Aliás, a “Constituição Cidadã” teve desde o início diversos artigos e dispositivos não regulamentados, principalmente o capítulo referente aos direitos sociais. Portanto, a atual Constituição nem foi regulamentada em seus dispositivos de maior interesse popular e foi rasgada continuadamente para assegurar, sem travas, a execução do projeto de recolonização neoliberal do país.
Neste sentido, é fundamental na agenda da esquerda e das forças populares a inclusão do tema da convocação de uma nova Assembleia Nacional Constituinte. A questão ainda divide o campo democrático e popular.
A bandeira de luta pela convocação de uma nova Constituinte enfrenta uma encarniçada resistência das classes dominantes e do conjunto dos partidos conservadores da velha direita neoliberal. Por sua vez, o bolsonarismo atua violando abertamente as atuais regras constitucionais, via medidas de governo e PECs que ferem os dispositivos da moribunda carta constitucional aprovada em 1988.
O debate sobre a necessidade da convocação de uma nova Constituinte surgiu no período das confusas manifestações de junho de 2013 e uma proposta chegou a ser apresentada no fim do primeiro governo da presidente Dilma Rousseff, que foi rechaçada de forma veemente pela então base governista no Congresso Nacional.
A crise de conjunto que corrói as atuais instituições do estado nacional é um dos sintomas do apodrecimento do atual sistema político do país, que trava as reformas estruturais exigidas para a construção de um estado verdadeiramente democrático, soberano e inclusivo das maiorias, rompendo com a atual forma oligárquica de controle do poder – e tutelada pelas Forças Armadas.
A luta em defesa da convocação de uma nova Constituinte é também um dos pontos programáticos fundamentais para assegurar uma saída pela esquerda da encruzilhada histórica em que o Brasil foi jogado por suas classes dominantes. É uma bandeira que precisa ser levantada pela classe trabalhadora e os demais setores oprimidos da população, abrindo o caminho para aproximar os interesses imediatos com um projeto de sociedade que assegure a mais ampla democracia social, liberdade política para os trabalhadores, igualdade entre homens e mulheres, o fim do racismo e todas as formas de discriminação.
Portanto, no atual processo de retomada das mobilizações populares, o debate sobre uma nova Constituição precisa ganhar aderência, força e apoio popular.
Ativista político e social. Autor dos livros ‘A Política Além da Notícia e a Guerra Declarada Contra Lula e o PT’ (2019), ‘A Saída é pela Esquerda’ (2020) e de ‘Lava Jato, uma conspiração contra o Brasil’ (2021) – todos pela Kotter Editorial. Escreve semanalmente em diversas mídias progressistas e de esquerda.