Expira em 24 quadros por segundo – Fabio Santiago

A memória brinca com nossos limites, o delírio e as possíveis realidades viram um emaranhado de possibilidades.

Repare no que vos digo, queridos leitores.

Por onde andará o meu amigo, do mundo da lua?

Foi no final dos oitenta, meu irmão PE, sabendo dos meus juvenis projetos fílmicos, apresentou o nosso sumido personagem.

Conhecia muita gente de teatro, iria me ajudar a rodar o vídeo.

Éramos tristes e fracassados.

Naquela época nos chamavam de videomakers.

Aluado agarrava-se em qualquer papel que lhe fosse oferecido, de protagonista em tape a figurante de filmes em película.

Penso que toda turma tinha um desejo, que ele desse certo em seu sonho de ator.

Para mim o que importava é que éramos sonhadores.

Repare, repare!

Meu amigo amava mulheres carnosas. Eu seguia a canção, Clever Boys Samba”, você conhece, leitor? 

O Caetano cantou em um especial da extinta TV Manchete, Procure no youtube, o programa está como, Circulado Vivo VHS 1992.

“As Brigittes vão passado e eu Belmondo.”

As Anna Karinas também, poeta Caetano.

Glauber e Godard embalavam qualquer sonho em 24 quadros ou 30 frames que passava pelas nossas cabeças.

São Paulo era um sonho distante. Para o amigo aluado, virou a sua quimera.

Rodei com ele apenas um curta, segui a gravar pequenos filmes experimentais com outros atores,

Me afastei das produções depois dos 21 anos, havia sacado que os quatro ou cinco vídeos que dirigi, tirando o primeiro, eram todos vídeos poemas.

O meu sonho da adolescência falava mais alto, a poesia era o que de fato queria fazer.

Passei a vida escrevendo poemas solitários.

O cinema era só ilusão.

Éramos tristes e fracassados, apaixonados pelas estrelas de cinema.

Neste tempo pouco encontrei o velho amigo da lua.

Virei estrangeiro daqueles anos.

Meu retrato, melancólico, indiferente, monótono, casmurro e blasé, mofava na estante.

O amigo aluado ainda vagava pela cidade, era o que os ventos diziam e também o WJ, que conheci no início dos anos 90.

Miou Miou, a atriz francesa foi a senha para a nossa amizade.

Quem nos apresentou foi o personagem da lua, que escorreu pela cidade.

Agora sou eu quem pergunto, WJ, onde andará o amigo do mundo da lua?

Há uns sete anos, penso tê-lo visto. Estava sentado em um banco, próximo ao bondinho da XV, em frente as mesinhas dos bares.

Perscrutava a cidade e as garotas.

O boné depositado em sua cabeça, trouxe a dúvida. Será que era ele?

As remembranças embaralham-se nesta hora, um boné pode causar confusão e destruir este reencontro.

As lembranças sofrem de amnesia.

Talvez fosse ele, na cidade em formato digital. Prefiro a transgressão do Super 8.

Onde andará o amigo da Lua? É isto que você,  WR e eu perguntamos para a tela, ou seria ao papel?

Torço que o aluado esteja morando na grande metrópole.

Este será o melhor desfecho para esta crônica, do ator das estrelas mais cadentes de São Paulo.

Repare, ela expira em 24 quadros por segundo.

Éramos tristes, fracassados e sonhadores.

Fabio Santiago nasceu em Maceió (AL), em 1973, e está radicado em Curitiba (PR). Publicou os livros A marca do vampiro (compre aqui, 2023), Cantos temporais e Mar de sombras, ambos em 2022, Versos magros (2021) e Intramuros (2020). É formado em Comunicação Social e criador do blog Acre infuso, ativo desde 2004. Redes sociais: @fsantiago006 (Instagram) e Fabio Santiagoc (Facebook)

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