Sertão de nós mesmos – Fabio Santiago

Há nos estados de júbilo um findar galopante e prenunciado.

Nestas veredas andarilhas, firmo meus passos.

Na solidão árida e caatingueira das metrópoles que engolem as vidas, ela falou sobre o ex-cangaceiro e o jogo de gamão em Maceió, revelou o encontro da criança com as crendices dos antigos.

Há nos estados de júbilo um desdenhar da tristeza, uma certeza ondulante e frágil que culminará nos abismos melancólicos.

O Lampião transcendental paira agorinha sobre a minha mente, psicodélico como o disco Afrociberdelia, do Chico Science & Nação Zumbi.

Um gole farto, um trago qualquer, uma dormência, recorto o tempo, lacrimoso e adeusístico.

Nos engole o fogo-fátuo, entre o sertão e a zona da mata, o agreste – Agrestino, volto logo!

Ouvi de soslaio a cantilena. Quem saberá deste vendaval de poeira?

Mary, minha irmã, traz luz para as minhas fixações pelo cangaço.

Há nos estados de júbilo um despencar de sensações que se esvaem com a chegada da queda.

Andarilhar é predicado dessa crônica, deste sertão de nós mesmos, por isso resolvo dar um pulo até o Rio com o meu Coração Psicodélico. Bernardo Vilhena, é isso: “Infeliz de quem está triste, no meio do salão”, nessa confusão, sigo o poema da canção: “Sim pro sol, sim pra lua, eu quero você toda nua, sim pra tudo que você quiser”.

Reanimar o pulso, alimentar as veias, subtrair derrotas, desmoronar vitórias, abanar as ventas, lambuzar as páginas, beijar o umbigo poético da gata garota e fazer chover.

Na psicotropicaliência das cordas bambas, no convés tempestuoso, lembro da minha banda imaginária da juventude, Acre Infuso. A música de trabalho se escondia dentro de um útero.

Acre Infuso, o disco etéreo e abismal, virou blog, com a bênção imaginária de Vinicius de Moraes, Raul Seixas, Jim Morrison e do padim Padiço, ainda pulsa.

Fome de viver!

Nesta crônica andarilha, o que foi, agora é, está sendo, revive. Só quem viu, soube.

Repare, repare!

O cangaço no Nordeste: questão social, banditismo, imaginário popular, folclore… O que ficou disso tudo e o que resiste?

A cada passo, o cadafalso.

Repare, o Rei do Baião cantou para o Rei do Cangaço:

“Maltratei, fui maltratado / Não fui bom, não fui feliz / Não fiz tudo quanto falam / Não sou o que o povo diz / … E os santinhos me mataram / Tá cheio de Lampião / E matando muito mais”.

Luiz Gonzaga cabe aqui neste andarilho sertão de página.

Há nos estados de júbilo a expressão da alegria desmedida, retrato para guardar a vida inteira.

Minha irmã fala sobre um dos cabras de Lampião e a criança de colo.

Peço a ela para gravar a história, ouço atentamente o relato, seu retrato.

Viu quem estava lá, o feito.

Há nos estados jubilosos um coração estourando no peito, a sensação de missão cumprida. A vida parece bastar.

Na crônica brotou este passado que um dia contarei com exatidão, cada palavra é um voo livre pelo suor do sertão.

Fabio Santiago nasceu em Maceió (AL), em 1973, e está radicado em Curitiba (PR). Publicou os livros A marca do vampiro (compre aqui, 2023), Cantos temporais e Mar de sombras, ambos em 2022, Versos magros (2021) e Intramuros (2020). É formado em Comunicação Social e criador do blog Acre infuso, ativo desde 2004. Redes sociais: @fsantiago006 (Instagram) e Fabio Santiagoc (Facebook)

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