Um Show de Rock’n’roll, Oh oh oh

“Na minha cabeça uma guitarra toca sem parar”, dizia o grande Raul Seixas, dando o toque.

Reza a lenda familiar que o pequeno Fabio, ou seja, eu, ouvia sem parar o disco de Elvis Presley, o álbum de 1973, Elvis (Fool Album). O menino tímido e chorão enlouquecia ao som do rei, coisas da vida.

Lá em casa, meus pais, Terezinha e Roberto, como gostaria que estivessem ainda por aqui, enchiam a casa de músicas, filmes, livros e plantas. Foi neste ambiente que cresci, com meus irmãos, Mary, Pedro e Sandra, atento a tudo que me mostravam, coisas da vida.

Comprei meus primeiros discos de vinil aos 12 anos, quem pagava não era eu. Legião Urbana, o álbum de estreia de 1985, “Será”, me conquistou de cara, discaço!

Era alimentado pelos meus irmãos com Blitz, Léo Jaime, Barão Vermelho, Paralamas do Sucesso, Biquini Cavadão, Gang 90, Camisa de Vênus, Kid Abelha… e por aí vai… Plebe Rude, Capital Inicial, João Penca e os Miquinhos Amestrados, Fausto Fawcett e os Robôs Efêmeros, Heróis da Resistência, Titãs… tantos artistas memoráveis, discos de tirar o fôlego, o rock corria nas veias, fosse antigo ou novo, clássico ou underground, coisas da vida.

Esta crônica que você lê é um pouco do que tento rememorar, do menino que fui, do adulto que tento ser, do rock que moldou um bocado de mim, coisas da vida.

Havia uma música que tocava na rádio, não conseguia saber quem cantava, tocava pouco, quando ouvia, pirava. No discaço de 1986, Rádio Pirata ao Vivo, do RPM, Paulo Ricardo cantava um trecho, foi ali ou pouco depois que descobri, The Doors, a banda da minha vida, ao lado da Legião Urbana, coisas da vida.

Os primeiros shows que assisti foram do Biquini Cavadão e do Roupa Nova, “Um show de Rock’n Roll, Oh oh oh.”

Meu irmão, Pedro, fanático pelo Raul Seixas, me levou para assistir ao show do Marcelo Nova, Envergadura Moral e o grande Raul, era a turnê do disco Panela do Diabo, julho de 1989, eu estava prestes a completar 16 anos. Na fila começaram a avisar — Menor não entra! Muita gente caindo fora. Sempre fui comprido, talvez tenha me ajudado um pouquinho. Pedro, meu irmão, me acalmou.

— Não se preocupe, você vai entrar! Nessa época ele era estudante de psicologia, ainda não estava formado. Chega a minha vez — Esse menino é menor, não pode entrar! Meu irmão, quase um monge budista, destilando todo o seu equilíbrio, com seus vinte e poucos anos — Ele é meu irmão, eu curso psicologia, cuidarei dele. O moço tentou argumentar, Pedro usava da paciência, ao longe o Marceleza com seu início clássico — Alôooooo! E a galera no “Bota pra fudê!”

Estamos nós ainda ali, então o moço, já de saco cheio, grita — Entra com este piá do caralho! E lá fomos nós, Raul, um gênio. Eu, um adolescente, meu irmão, fodástico! Coisas da vida.

Lembrei agora da minha banda imaginária, Acre Infuso, inspirada em um poema do Rimbaud, com tradução do Mário Cesariny, li em uma entrevista da amada poeta, Helena Kolody. Pois bem, Acre Infuso virou meu blog. Desenhava todas as capas dos discos imaginários em cadernos. Das composições da banda resgatei, para a minha poesia, estes versos, “me esconda dentro do seu útero e lá ficarei a pensar, fico grato pela pousada.”

A banda nunca saiu do papel, só da cabeça, coisas da vida.

O celular toca, ligação do Rio de Janeiro, nosso amigo Binho Maturano, será que aconteceu alguma coisa? Era um sábado à tarde — O Michel está tentando falar com vocês, enviou mensagens no seu Whats e Insta! Como pude esquecer, tem show da Legião Urbana na cidade, nosso amigo Michel veio do Rio com a banda, tem um presente para nós, dois ingressos.

Largamos tudo que estávamos fazendo e corremos para a Pedreira Paulo Leminski.

Sou revistado — Você está vestido igual ao pessoal da segurança, achei que era um dos nossos. Enquanto isso, Angela está sendo revistada, a moça pede para ela abrir a bolsa — Tem a minha água, barrinha de cereal, meu tercinho e uma maçãzinha… A segurança, diante da roqueirinha, olha bem no rosto dela, fica muda por um instante e logo diz — Vai, vai, vai, vai, pode entrar! Angela está sendo ela, tem algo mais Rock’n Roll do que você estar na contramão do que está posto? Coisas da vida.

Ainda tenho guardado recortes de jornal sobre a escrita do grande Mário Bortolloto, ele sempre foi muito importante para mim, um dia beberia com ele, bebi e ainda bebo. Angela e eu estamos em São Paulo, fomos assistir aos shows das suas bandas, Roberto Embriagado e Saco de Ratos.

Na apresentação na Ria Livraria, ela pediu o seu suquinho de frutas e eu não fui de whisky, estava na cerveja. O rock rolava forte, lá pelas tantas, graças ao Marião, bebemos com o sangue bom, Paulão, da banda Velhas Virgens, coisas da vida.

São Paulo é mágica, já nos deu tantos presentes no universo das letras e também no rock, poder bater um papo com o mestre Fausto Fawcett e tomar uma ao lado da queridona, Taciana Barros, da Gang 90, diz muito sobre a magia de SP.

O Rock’n Roll continua embalando os meus dias, muita gente que curto acabou não entrando nesta crônica, muitas fases do rock, tanta história para contar.

Estou vestindo minha camiseta dos Beatles, na parede um quadro de Jim Morrison, pego o copo que está cheio e termino num gole só, ergo a gola da jaqueta, coloco os óculos escuros, na minha cabeça

Rita Lee lança seu toque, “Quando a lua apareceu, ninguém sonhava mais do que eu”, coisas da vida.

Fabio Santiago nasceu em Maceió (AL), em 1973, e está radicado em Curitiba (PR). Publicou os livros A marca do vampiro (compre aqui, 2023), Cantos temporais e Mar de sombras, ambos em 2022, Versos magros (2021) e Intramuros (2020). É formado em Comunicação Social e criador do blog Acre infuso, ativo desde 2004. Redes sociais: @fsantiago006 (Instagram) e Fabio Santiagoc (Facebook)

Respostas de 4

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