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por Bruno Nogueira

 

Começo a meditar fechando os olhos. Tento imergir no ambiente a meu redor, apesar de tudo. Tento sentir o peso do meu corpo na cadeira, as mãos apoiadas nas coxas e me concentrar nos sons ao meu redor, como diz o aplicativo. Escuto os poucos carros que passam a essa hora, o vibrar de uma mensagem que chega (coloquei o celular na escrivaninha depois de ligar pra polícia), ouço a trinca da janela que finalmente arrebenta e o ofegar do homem que entra por ela. Seus pés são tremor no chão da sala.

 

Silêncio. Deve estar parado, olhos em busca do que tem valor. A falta de som dura um segundo, que é infinito e dói. Escuto os passos se aproximando. Tento me concentrar em meu corpo, na respiração, mas não consigo. Ele tenta a maçaneta do quarto, que não tem chave e range quando abre. Ele entra.

 

Silêncio. Ele para quando me vê. Espera uma reação, mas não dou. Me manda não me mexer. Não pretendia. Os passos se aproximam cautelosos, densos. De início ele mantém distância. Depois percebo que chega mais perto.

 

Silêncio. Sinto seu hálito no rosto, um leve cheiro alcóolico. De repente uma pancada estranhamente leve (dois dedos?) faz tombar minha cabeça, que deixo cair feito boneca. Não abro os olhos, mas não consigo controlar a respiração que agora corre desordenada. Ele se afasta. Ouço barulhos na escrivaninha. Ele pega o notebook e o celular, certeza. Os passos começam a se afastar — mas ainda dentro do quarto, param. Minha respiração também.

 

Silêncio. Os passos voltam na minha direção, mais devagar. Deliberados. O calor de uma mão se aproxima do meu peito, mas ela não me toca. Sinto dois dedos na lateral da garganta. Fecho os olhos com mais força, aperto. Meu coração bate como alguém que tenta fugir de um caixão. Escuto um suspiro. O som de três teclas pressionadas no telefone.

 

Silêncio. A voz dele é fina, mas não suave. Ele fala rápido. Passa meu endereço. Diz que uma amiga está passando mal e precisa de uma ambulância urgente. Diz “que merda”, mas deve ser depois de a ligação terminar. Ouço os passos que se afastam rápido, chegam na sala, e um som estranho, acho que é ele pegando a televisão. Ele sai pela janela.

 

Silêncio.

 

Abro os olhos. Minha respiração ainda fora de controle, o celular na mesa. Corro até a sala, idiota, não adianta fechar a janela, a trinca foi quebrada. Me apoio na parede, escorro por ela. Estou tonta, vou desmaiar. Não controlo a queda. O chão se aproxima enquanto escuto sirenes à distância.

 

*Bruno Nogueira é um escritor e tradutor mineiro, nascido em Lagoa da Prata e radicado em Curitiba, onde busca concluir um mestrado em literatura.

*Autor da imagem: Jr. Korpa

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